domingo, 22 de enero de 2017

Ética na política brasileira?





“O que é esclarecimento?” Segundo Kant, esclarecimento é à saída do homem de sua menoridade. Menoridade esta que é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro individuo. E o culpado dessa menoridade é o próprio individuo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a sua causa dele não se encontra na falta de entendimento, mais na falta de decisão e coragem de servir – se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento.

 

Temos a marca das injustiças sociais em suas mais variadas formas. Não podemos ficar lamentado – as, é necessário um enfrentamento para não nos tronarmos reprodutores das mesmas e então, ainda que não sejamos os autores diretos das mesmas – pois que eles (os atores que as implementaram concretamente no passado) nem estão mais entre nós – corremos o risco de passarmos a condição de culpado.

 

Os princípios da “ética da responsabilidade” correspondem à necessidade dos governos de promoverem o bem comum, de grandes grupos ou de toda a população, e para isso esses governos lançam mão de qualquer meio que enseje o alcance dos seus objetivos. Por exemplo, seria justificável até a pena de morte para criminosos incorrigíveis a fim de evitar que voltem a causar mal à sociedade.

No Brasil fica claramente demonstrado que em política quase tudo é feito contrariando normas morais e princípios éticos, pois, para começar, os políticos não são éticos quando mentem aos seus eleitores, fazendo promessas que jamais pensaram em cumprir, já que o seu único objetivo é alcançar um mandato que lhes permita legislar para seu próprio benefício ou de grupos hegemônicos, ou administrar bens públicos, para retirar deles o que puderem para si e para seus aliados. Neste caso parece claro também que a política brasileira adota a “ética da responsabilidade”, com a diferença de utilizar como meio o sacrifício da sociedade e, como fim, o favorecimento a pequenos grupos, e a criminosos, entre os quais alguns políticos.

É comum, quando alguém menciona este estado de coisas, vir junto o esclarecimento de que uma minoria é responsável por ele, que há grande quantidade de bons políticos e outras coisas, mas a nossa observação nos leva a concluir que, pelo contrário, há muito poucos políticos bem intencionados, que chegam a abandonar a carreira por não concordarem com o que acompanham entre seus pares, e também por não suportarem a pressão que aqueles lhes fazem para que se aliem às suas falcatruas.

Para reforçar estas afirmações é muito fácil incluir fatos conhecidos e comprovados, como a busca incontrolável do Congresso Nacional pelo aumento dos seus próprios salários e benefícios, que resulta no aumento em cascata dos vencimentos dos demais patamares legislativos, enquanto levam meses para decidir sobre um insignificante reajuste do salário mínimo nacional. O nepotismo atinge níveis intoleráveis nos três poderes da República, com todos seguindo emaranhados caminhos para incluir parentes e amigos entre os afortunados detentores de ganhos públicos, alguns sem nada fazer, desperdiçando descaradamente valores arrancados dos parcos salários da população, através de impostos que estão entre os mais altos do mundo.

Aproveitando o comentário, não seria ruim pagar altos impostos, como fazemos se houvesse reciprocidade na prestação de bons serviços à população nas áreas de saúde pública, educação e segurança.

Já houve época em que no Brasil buscava-se a escola pública por ser de melhor qualidade, e não são poucas as pessoas de destaque que foram muito bem formadas através delas. Mas hoje o que se vê são professores mal formados, desinformados e mal remunerados, tentando ensinar qualquer coisa a alunos que não têm motivação para estudar, pois para alguns tanto faz estudar muito ou pouco, já que serão sempre marionetes em uma sociedade dominada por interesses minoritários, encontrando somente empregos cuja remuneração não passa do salário mínimo.

A segurança pública é vergonhosa, apodrecida também por altíssimos níveis de corrupção, cedendo diariamente espaço a grupos criminosos muito bem organizados e armados, infiltrados entre a população, que em alguns casos os considera seus protetores e benfeitores já que não confia na polícia e nas demais instituições brasileiras. A criminalidade alcança status de terrorismo, com atentados organizados a propriedades públicas e privadas, como a queima de ônibus repletos de inocentes passageiros que morrem sem saber o motivo, obrigando a população a evitar sair de casa em alguns bairros das grandes cidades por temer o alcance de alguma bala perdida. Já se constatou que grupos criminosos organizados patrocinam entre os seus componentes a formação de advogados para defenderem os seus interesses e não seria improvável também patrocinarem a eleição de políticos, com a mesma finalidade.

Quanto à saúde pública o que existe é suficiente apenas para acompanhar aqueles mais resistentes, capazes de esperar durante meses por atendimento médico, pois os que se encontram em estado grave simplesmente morrem sem atendimento nas portas dos hospitais, às vezes sem dispor de médicos ou meios suficientes e até fechados, por consequência da má administração de mandatários incompetentes e mal intencionados ou por alguma descabida disputa política.

Isto já é suficiente para encher qualquer pessoa de indignação, mas há mais, envolvendo outras necessidades básicas do ser humano, como a alimentação, pois consta que 44 milhões de brasileiros, 25% da população total, vivem abaixo da linha da miséria, e cerca de 9 milhões deles passam fome. Na contramão desse fato, conforme matéria da revista Superinteressante de março/2007, em todo o país é jogada no lixo, diariamente, 39 mil toneladas de alimentos, considerando somente a parte em perfeito estado, suficientes para prover café da manhã, almoço e jantar para 19 milhões de pessoas, todos os dias. E quando alguém perguntou sobre essa situação desumana, o Ministro Extraordinário da Segurança Alimentar respondeu simplesmente que a responsabilidade cabe ao modelo econômico brasileiro, que concentrou renda e gerou desemprego.

Então porque as forças políticas do país, tão céleres quando se trata de atender aos seus próprios interesses, não agem de forma eficaz para resolver o problema, que atinge também a cadeia produtiva, já que produtores são obrigados a atirar os excedentes no lixo, tudo porque os brasileiros miseráveis não têm dinheiro para comprar os seus alimentos, que correspondem a essas mesmas quantidades excedentes? Os produtores não têm como distribuir gratuitamente os excedentes porque assim os seus prejuízos seriam ainda maiores, em consequência das dificuldades de transportes e seu alto custo. Mas ninguém faz nada, pois isso não seria oportuno já que não estamos em época de eleição. Os miseráveis continuam com fome e assim caminham a humanidade e a política brasileira.

Quando explode cada um dos inúmeros escândalos de corrupção, a mídia explora exageradamente os fatos, parecendo estar a serviço de grupos de oposição aos que é alvo de investigações. Mas mesmo assim, como se tudo isso fosse pouco, nada é feito para punir os culpados, trazendo outro elemento à nossa cena política: a impunidade. Esses mesmos políticos envolvidos nos casos de corrupção, que enojam a maioria dos brasileiros, acabam sendo reeleitos, provavelmente pela massa popular manipulável, mantida pobre e com baixa escolaridade exatamente com esse propósito. Ninguém pune ninguém, fazendo parecer que todos, nos três Poderes da República, nos três níveis de governo, têm algum tipo de culpa, e que entre eles há pactos de não se incomodarem uns aos outros. Alguém pode até ser condenado, mas não cumpre a pena.

O legislativo aprova leis baseadas em princípios imorais para beneficio dos próprios políticos e, se algum deles é questionado por alguma ação obscura, afirma que o seu ato é legal, já que a lei existe. Nossos políticos lançaram a sua reputação e os seus parâmetros éticos ladeira abaixo, pois nas pesquisas sobre a credibilidade das instituições eles estão sempre em último lugar e, cinicamente, parecem não se incomodar com isso.

Que país abençoado é o nosso! Apesar dos desmandos da nossa política e das nossas instituições, vivemos em uma terra fantasticamente bela, fértil e próspera, onde tudo é grandioso, com vários tipos de clima e vegetação, onde estão a maior floresta tropical, a maior fauna e os maiores rios do mundo, com enormes e invejáveis potenciais, sem terremotos ou furacões. Nossa economia é pujante. Somos um povo dotado de maravilhosos talentos, bem constituído, pacífico e paciencioso, capaz de superar dificuldades, curar mazelas e continuar crescendo, incomodando as maiores economias do planeta.

Por tudo isso temos o dever de nos opor a esses desmandos, também pacificamente, com ações populares que levem o Legislativo a conceber leis inspiradas em princípios éticos universais e o Executivo e o Judiciário a obedecê-las, priorizando os interesses da coletividade, estabelecendo medidas voltadas para a desconcentração da renda e a geração de empregos, e promovendo de forma maciça a educação, como principal meio de saída da situação em que nos encontramos. O Brasil necessita e merece isso, para seguir a sua vocação de grande potência mundial, com brasileiros felizes e sem a miséria física e moral a que são submetidos, com ética na política.

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